PORTO + NORTE


  • VCI | Era Uma Vez Um Jardim | Para Quem Construímos?

    O mais recente texto do Alexandre relativo à VCI e as promessas sobre a mesma, veio em boa altura. Em boa altura por, como muitas vezes, eu ter ido dar uma passeata nocturna. Pela milésima vez veio-me ao pensamento, “Quando tiram esta coisa – a VCI -, daqui?” Ou, pelo menos, arranjam modo de amenizar o ruído, a poluição, o cheiro. Moro junto à VCI. É mesmo ali, ao fundo da rua. Da rua que ficou cortada, com promessa de passagem para o outro lado. Agora, com a destruição do pequeno jardim, do outro lado da rua, o tal, desligado deste lado, entre o Conde de Ferreira, a VCI e a Avenida Fernão de Magalhães, tornou-se ainda mais insuportável o ruído, o cheiro, o calor. No local do pequeno jardim vão surgir prédios de apartamentos de luxo. Para quem?

    Numa cidade com menos de um quarto de milhão de habitantes, constantemente a perder gente, pejada de prédios, apartamentos, casas vazias, em bom, assim-assim, e mau estado, que podiam ser utilizadas, deitam-de abaixo, destroem-se espaços verdes, para se construir mais apartamentos de luxo. É uma dor de alma passar pelo espaço do abrigo jardim. A maioria das árvores foi abatida.

    Passou a ver-se os prédios da Fernão de Magalhães. Perdemos um espaço verde, um pequeno aconchego e refúgio para, um destes dias, vermos os novos prédios de luxo.

    Escreve o Alexandre: “As grandes urbes do futuro não são desenhadas em torno do automóvel, mas em torno das pessoas. São elas que merecem uma cidade viva, pulsante, onde se possam mover sem obstáculos, sem ruído, sem poluição. E o Porto, se tiver a coragem de olhar para além das promessas de circunstância, pode também alcançar essa visão. Mas até que o faça, até que a VCI deixe de ser essa ferida aberta no corpo da cidade, temo que continuaremos a ouvir promessas, sem jamais ver soluções verdadeiras.”

    As grandes, médias, ou pequenas urbes do futuro, são, de facto, desenhadas, pensadas para as pessoas, não em torno do automóvel. O Porto ou não recebeu o memorando, ou esqueceu-o algures. Continua no passado. No automóvel, na construção, no turismo sem rei nem roque. Futuro parece ser coisa desconhecida. Na construção, estamos em alta, nos espaços verdes, em baixa. Aqui na zona, é um frenesim, incluidor de destruição de logradouros, jardins e quintas de moradias, substituídos por betão, calçada portuguesa ou outras matérias. Lojas transformadas em garagens, levando a ruas desoladas, sem gente. E, claro, temos ali a VCI ao lado. A questão da VCI vai para lá da mesma. De a fazer desaparecer do meio da cidade. Se, porventura, deixar de existir, o que será feito com o espaço da mesma? Mais prédios? Um corredor verde, ao jeito da High Line, em Nova Iorque?

    Falando em Nova Iorque. Por lá, também há casa aos jardins. O Elizabeth Street Garden também está em risco, por o Mayor de Nova Iorque aí querer construir habitação social. Ao contrário do pequeno jardim aqui da zona, o Elizabeth Street Garden tem amigos conhecidos, como a Patti Smith, o Martim Scorcese, o Robert de Niro, e muitos outros conhecidos e desconhecidos, que lutam por ele. Amigos que propuseram várias alternativas viáveis para a construção de habitação social, que se organizaram para criar um Land Trust de modo a poderem adquirir e preservar o jardim. No Porto, ficamos, quase sempre, quietos e calados. Seja em relação à VCI, ao pequeno jardim junto à mesma, a Impermeabilização do solo, do que seja.

    Apesar de ter havido quem, brevemente, tenha manifestado o seu desagrado pela destruição do pequeno jardim. Os panos de protesto desaparecem num piscar de olhos. Quanto à paragem do autocarro 300, junto ao ex-jardim, na qual ninguém está ou sai, e ao novo, absurdo, trajecto do referido autocarro, o assunto fica para outro texto.

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  • VCI – Promessas – “Sempre quentes, nunca servidas”

    A visita do Ministro das Infraestruturas ao Porto trouxe a velha promessa de sempre: até ao final do ano, haverá uma solução para a VCI. Sim, a mesma VCI que corta a cidade ao meio como se fosse uma auto-estrada no meio de um parque infantil. E, claro, ouviu-se a ladainha habitual. Que se vão estudar alternativas, que se vai resolver o problema, que é uma prioridade. Mas, honestamente, quem ainda acredita nisso?

    O Porto convive há décadas com esta aberração urbanística, e sempre que o tema volta à agenda surgem soluções que mais parecem pensadas para manter o status quo. Proibir os camiões de passar na VCI? Deixar de portajar as vias alternativas? Isso não são soluções, são remendos. E remendos que já conhecemos bem. Nenhuma dessas medidas vai resolver o problema central: a VCI continua a ser uma auto-estrada a rasgar uma cidade que, francamente, merecia muito melhor.

    Qualquer tentativa séria de resolver o problema da VCI passa, obrigatoriamente, por desclassificá-la como auto-estrada. Mas esse tipo de medida implica uma coragem política que, até agora, ninguém demonstrou. Desclassificar a VCI significa repensar a mobilidade do Porto, redireccionar o trânsito, investir em infraestruturas alternativas e, acima de tudo, admitir que não se pode ter uma cidade moderna com uma auto-estrada no meio.

    O problema é que as promessas sobre a VCI não são novas. Eu, como tantos outros, já deixei de acreditar. Deixei de esperar que, de repente, alguém em Lisboa perceba que uma cidade como o Porto não pode viver permanentemente sob o jugo de uma estrada que causa mais problemas do que resolve. E enquanto continuarmos a ouvir os governantes a falar de “soluções”, sem nunca realmente mexer no cerne da questão, vamos continuar na mesma.

    Aliás, a maior falha aqui não é a falta de ideias, é a falta de vontade de assumir que para melhorar o Porto é preciso fazer escolhas difíceis. É preciso pôr fim a esta ideia peregrina de que uma auto-estrada pode atravessar o coração de uma cidade e que isso é normal. Não, não é normal. E as cidades que perceberam isso já tomaram as medidas necessárias. Cidades modernas e bem-sucedidas não permitem que as auto-estradas as dividam. É uma regra básica do urbanismo: cidades são para pessoas que nela vivem e trabalhem, não para as que por ela passam e atravessam, ainda para mais de carro ou camião.

    Não, senhores, nenhuma auto-estrada deve atravessar uma cidade. Esta é a primeira regra do urbanismo, ou deveria ser. As grandes urbes do futuro não são desenhadas em torno do automóvel, mas em torno das pessoas. São elas que merecem uma cidade viva, pulsante, onde se possam mover sem obstáculos, sem ruído, sem poluição. E o Porto, se tiver a coragem de olhar para além das promessas de circunstância, pode também alcançar essa visão. Mas até que o faça, até que a VCI deixe de ser essa ferida aberta no corpo da cidade, temo que continuaremos a ouvir promessas, sem jamais ver soluções verdadeiras.

    Portanto, sim, podem continuar a prometer que até ao fim do ano haverá uma solução para a VCI. Mas enquanto essa solução não passar por retirar o estatuto de auto-estrada e integrar a VCI de forma inteligente no espaço urbano, não vamos a lado nenhum. Até lá, é só mais uma promessa que soa bem, mas que não vai resolver absolutamente nada.

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  • Avenida da Ponte – passo a passo

    Esta é uma boa oportunidade de construir, em diálogo online, esboços de propostas que possam servir de base à posterior elaboração de um caderno de encargos para um concurso de ideias que a Câmara Municipal do Porto venha a lançar. Tenho neste momento 3 preocupações/objectivos:

    • que haja acção em tempo útil;
    • que a participação da sociedade civil se concretize de forma eficaz;
    • que não se limitem à partida, nesse concurso, as opções para aquele espaço (ou seja, tem de poder acomodar as propostas que já tenham surgido e outras que venham a aparecer, para se decidir depois).

    A Avenida da Ponte (nome popular para a Avenida D. Afonso Henriques) não é, neste momento, um bom local para habitar, como bem escreve a Raquel. Mas está ao nosso alcance mudar radicalmente a situação, com construção de volumetria muito moderada, com apartamentos grandes (insisto nas famílias multi-geracionais e em co-living) e zonas colectivas aprazíveis, verdes qb., com reformulação da circulação automóvel e remoção das camionetas turísticas. A propósito, ainda fará sentido manter o viaduto de Duque de Loulé?

    Eu moro no Centro Histórico e estou bem cá, mas podia estar melhor se a gestão desta zona fosse mais adequada. Na Avenida da Ponte não haverá as vistas que eu tenho das minhas janelas nas Escadas do Barredo, é certo. Mas haverá estacionamento (um dos requisitos indispensáveis) e acesso fácil. Será uma boa solução para quando precisar de habitação maior, por exemplo.

    Brincando aos arquitectos, eis algumas ideias.

    Não faz sentido manter duas vias paralelas para subir a avenida, como actualmente. Eu demoliria aquela zona assinalada a vermelho, tornando menos escura a entrada para a rua com esse nome, mesmo que aquele volume assim libertado fosse substituído parcialmente por construção nova. Desviaria o traçado da avenida para o representado pela seta azul, mantendo as estruturas do Metro assinaladas a verde (para evitar complicações e custos adicionais). Nesta configuração, demolindo o Mercado de São Sebastião, passa a haver bastante espaço a Nascente (à frente da escarpa) e Poente da avenida para nova habitação. E o que mais quiserem.

    É importante que os futuros utilizadores participem no desenho desta parte da cidade, pois estarão assim a definir onde querem viver, onde querem trabalhar, por onde vão circular. Repensar a Avenida da Ponte não pode ser apenas projectar para terceiros, é tomar em mãos a reabilitação de um lugar que é nosso. Para que continue a ser nosso.

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  • Ainda a Avenida da Ponte | Discussão Urbana

    por Raquel Pinheiro

    Tal como o Alexandre, quando vejo o número de habitações apontadas como possibilidade para a Avenida da Ponte, 200 ou 300, penso nos erros urbanísticos dos bairros sociais, e não só, e suas monovalências.

    Penso, igualmente, em quantos automóveis se traduzem 300, ou 200 habitações. 300? 200? O dobro desses números? Metade desses números? Supondo um automóvel por habitação, teríamos 300, ou 200.

    O Tiago gosta da ideia de habitações grandes, para famílias que se queiram fixar na zona por muitos anos. Olhando para a zona como está, como poderá ficar, porque quereria ir viver para ali, com ou sem família? Por ora, temos de um lado o casario do Centro Histórico, a Sé, supermercado de estupefacientes. Do outro, a movida do Mercado Time Out, hordas de turistas no Átrio de São Bento, com as muito turísticas Mouzinho da Silveira e Rua das Flores ao perto.
    Mais para cima, a Avenida que deixou de ter continuação. Tirando um ocasional passeio de curiosidade, nada me atrai para essa zona caótica, poluída, sem valências.

    “Posto isto, sendo consensual que o Centro Histórico tem falta de residentes, como é que isso se resolve?” dito pelo Tiago. A realidade é mais abrangente. O Porto tem falta de residentes. Como se resolve? Há maneiras. Implicam mudanças no modo de pensar, sentir a cidade, para onde ir.

    O espaço verde para o que é, ou era, a Avenida da Ponte não tem de ser um jardim.

    Diz o Alexandre:
    “o que hoje necessita esta área não é mais uma Avenida, porque já não existe, mas sim uma reinvenção deste espaço urbano, colmatando empenas e feridas existentes, atribuindo-lhe construção a uma escala adequada ao contexto e com função integrada na cidade.”

    Muito bem. Qual a reinvenção desse espaço urbano, entalado entre um Centro, uma Baixa, edificada, sufocada, sem espaços verdes, piscina pública, parques infantis, e afins?

    Diz igualmente o Alexandre:
    “Não defendo nesta fase mais o que um levantamento rigoroso e uma discussão, noutra o Desenho Urbano.”

    E a debater temos andado. Concordo com o Alexandre. Não se deve atribuir o projecto, qualquer que ele seja, a seja quem for sem antes haver discussão pública.

    Tiago, o Saldanha, a Estefânia, Arroios, para um Lisboeta, ou para quem, como eu, viveu em Lisboa, não são o Centro. O Centro é o Centro Histórico, Mouraria, Alfama, Castelo, etc. e a Baixa Pombalina, que sofrem dos mesmos males que o nosso Centro Histórico e Baixa.

    Quanto à Discussão Urbanistica apontada pelo Alexandre:
    “Governar a cidade é 80% tratar de Urbanismo. É uma Ciência e é uma Arte que para agir necessita de compreender e, por isso, é complementada pela Sociologia, Geografia, História, Economia, e para saber dar respostas ainda necessita da Engenharia e da Arquitectura. (Naturalmente poderíamos acrescentar mais.)”

    Acrescento ao acima 80% Urbanismo e Humanismo e História da Arte e Património. Os processos e a sua linguagem são incompreensíveis para a maior parte dos cidadãos. Até para mim, em boa parte o são. Como muitas outras coisas, os processos são feitos para serem entendidos por uma minoria, afastando do debate, do pensar, do ponderar, a generalidade dos cidadãos.

    Sem abandonar a necessária linguagem técnica, a apresentação dos projectos deveria ter linguagem acessível e compreensível a todos. De outro modo, continuaremos a ter cidadãos de costas voltadas aos seus próprios interesses, bem-estar e, claro, sem intervir no destino da cidade, que é, também, o seu.

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  • Regulamentos 2

    A propósito do post anterior.

    Análise ao processo de Licenciamento, Processo NUP/59199/2022/CMP
    Local da obra: Rua do Molhe 19 e 24, Avenida de Montevideo 18 e 24 e Rua de Gondarém 825 e 829

    Enquadramento com o actual PDM
    A localização da obra a licenciar, situa-se de acordo com a Planta de Ordenamento do actual PDM, como respeitante à Área de Edifícios de Tipo Moradia.

    Ver análise técnica no PDF em anexo:

    O caso aqui relatado não é único, conheço muitos mais e em pormenor, e não vou me estender neste assunto porque não sou Procurador, polícia ou investigador. Estas situações competem a quem de Direito. Esta situação decorre em frente à minha residência, daí ter-me interessado pelo assunto.

    Agora pergunto eu se isto lembra o diálogo entre o António Feio e José Pedro Gomes ou, se bem lido o post que fiz sobre os “Regulamentos”, lembra a quê? Relembro que o Paulo Morais foi, por breves instantes, Vereador de Urbanismo no Porto e o responsável pela assinatura do Licenciamento deste prédio.

    Não sei se será por demais conveniente virmos aqui discutir processos de licenciamento em curso ou até já licenciados. Porquê? Porque pode levantar um véu que será complicado de fechar, levantar suspeitas sem fundamento, e cair no discurso fácil do tipo do “Chega”.

    O que na verdade é necessário, é mesmo pegar na legislação vigente, deitar fora, mais a estupidez do dito “Simplex”, e fazer algo completamente diferente e simples. O que é preciso é termos uma forma de gerir cidade, como estou farto de referir, que se sustente noutra forma e noutros conceitos.

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  • Montebello (com 2 “l”)

    Percebo bem o que o Alexandre Burmester escreve porque, lá está, há muitas outras coisas que não percebo. Por exemplo, apareceu-me há dias esta promoção do empreendimento Montebelo Villas (umas vezes o duplo “l” é no “Montebelo”, outras só no “Villas”). Em plena Foz Velha, em zona classificada como “Espaço Central”, “Área Histórica”. Havia um jardim.

    Vale a pena ouvir a argumentação do arquitecto (que tem bom trabalho noutros locais). Mas depois leia-se o que estipula o PDM:

    E vêm-me à ideia imediatamente António Feio e José Pedro Gomes.

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  • Regulamentos

    Nós, os técnicos autores de projectos, vivemos sobrecarregados de regulamentos, sejam aqueles determinados pelas Leis gerais, sejam os municipais. São tantas regras, Decretos e Portarias que se torna impossível, por um lado, conhecê-los todos e, por outro, cumpri-los integralmente. Ainda mais porque, muitas vezes, algumas dessas normas contradizem outras.

    Essa vasta legislação e suas inúmeras regras tornam-se até ridículas, pois é inviável para nós, como técnicos responsáveis por projectos, fazer um Termo de Responsabilidade, exigido por Lei, garantindo que cumprimos todas. Fazendo uma analogia, é como se ao dirigir um automóvel fosse possível seguir à risca todos os sinais de trânsito. Sabemos é que, quando um polícia nos manda parar, alguma regra não foi por nós cumprida.

    No meio dessa confusão de cerca de 6.000 Decretos e Portarias que regulamentam a construção, facilmente percebemos que, se por um lado tudo é impossível, por outro tudo é possível. Existe sempre uma regra, e pior ainda, uma interpretação, que nos leva a uma possibilidade de ilegalidade ou legalidade, dependendo do que se deseja.

    Assim como eu, enquanto técnico, me vejo perdido entre tantos regulamentos, o mesmo acontece com as entidades licenciadoras.

    Hoje em dia, sempre aconselho os clientes a acompanhar um processo de licenciamento com um jurista especializado (é preciso saber escolher, pois há muitos, mas a maioria não entende do assunto). O objectivo é, por um lado, ajudar a interpretar as regras que precisamos aplicar conforme o nosso interesse, e por outro, auxiliar as entidades a colherem pareceres que lhes transmitam segurança nas decisões que precisam tomar. O propósito é apenas o de garantir a segurança legal e o andamento dos processos.

    No meio dessa confusão, muitos serviços técnicos, sejam das Câmaras ou de outras entidades licenciadoras, acabam por aprender maneiras de aplicar e contornar as leis conforme suas conveniências. Essa característica naturalmente leva à constante sensação de que a legalidade, às vezes, é aplicada de uma forma e, em outras, de forma diferente. Nossa percepção dessas situações geralmente aponta para a corrupção, seja ela por pagamento ou por favor.

    Este assunto tem pano para mangas, mas vem aqui a propósito do projecto de residências na Rua da Boa Hora e Breiner e a vontade do “Movimento de Cidadãos da Cidade” em solicitar uma comissão arbitral para analisar o cumprimento do PDM do Porto e seus regulamentos, bem como outros que se aplicam a este caso.

    Em várias situações semelhantes, já interpelei Câmaras e recorri a tribunais. As Câmaras, muitas vezes, justificam com um regulamento que não se cumpre, apresentam outro que não tem nada a ver com o assunto, mas que parece dar razão e lhe conferem uma aparente legalidade. Os Tribunais, por sua vez, interpretam que, em caso de construção, se algo não é legal, devem ser bem analisados (pelos próximos anos), pois sempre há como restabelecer a legalidade pela demolição. E vale lembrar que, se poucos advogados entendem de processos administrativos relacionados ao Urbanismo, no caso dos juízes nenhum entende.

    Entendo e, em parte, concordo com a ideia de que alguns interiores de quarteirões são desvirtuados, não tanto pela permeabilidade, mas pelo uso excessivo, como é o caso aqui.

    Não antevejo muito sucesso para o Movimento de Cidadãos, mas apoio fortemente sua tentativa, pois essa é a única forma que temos para provocar uma mudança na maneira de gerir o espaço que é de todos.

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  • Projecto de residências universitárias na Rua da Boa Hora e Breiner

    Venho por este meio partilhar a nossa luta contra estes projetos, que são atentados ao património da cidade e à permeabilidade dos interiores dos quarteirões.

    Estes projetos não cumprem com os regulamentos municipais mas no entanto foram aprovados por se tratarem de projetos financiados pelo PRR. Aqui segue o link para uma petição criada, e abaixo a transcrição de uma reclamação identificando algumas das ilegalidades em causa.


    Exmos Srs. Presidente da Câmara e Vereador do Urbanismo do Município do Porto:

    Ao abrigo do artigo 118º do RJUE, venho por este meio requerer a intervenção de uma comissão arbitral, para resolver o conflito decorrente da aplicação dos regulamentos municipais no processo de obras de demolição, reconstrução com alteração e ampliação e construção com vista à instalação de uma Residência de Estudantes com Equipamento Desportivo destinado a utilização coletiva, promovido pela Reitoria da Universidade do Porto, sito na Rua da Boa Hora n.º 18 a 32; processo nº NUP/13405/2024/CMP.

    Os principais conflitos são:

    • A violação dos artigos 51º, 86º e 142º do RPDM
    • A violação dos artigos 59º, 60º, 62º e 73º do RGEU – A Direção Municipal de Urbanismo está a considerar erradamente não aplicáveis este artigos uma vez que uma residência de estudantes é um edifício de alojamento ou de “serviços habitacionais” conforme descrito no artigo 119º do PDM e conforme explicito na Portaria 35-A/2022. De realçar que este projeto prevê unidades de alojamento, identificadas como fogos habitacionais pelo próprio projetista na ficha Q3 e que a definição de “fogo” está descrito no Decreto Regulamentar n.º 5/2019 ficha I-31 como integrada no conceito de alojamento.
    • A DMU tem responsabilidade também de garantir que uma nova intervenção urbanística não põe em causa a legalidade das construções vizinhas, nomeadamente no que respeita ao artigo 60º do RGEU e à violação dos direitos à salubridade e à insolação. As novas construções têm de garantir os afastamentos mínimos de 10m às fachadas existentes e as alturas das edificações propostas em confrontação com os logradouros vizinhos não podem agravar as condições existentes.
    • A violação do artigo B1-7 do CRMP.
    • No ponto 6.6.4 do Relatório do PDM, está expresso claramente o plano de “Requalificar o Complexo Desportivo Universitário do Porto (CDUP)” para “reforçar a dotação da cidade em equipamentos desportivos de proximidade” – Medida não cumprida pelo projeto em questão que prevê a sua demolição total, inclusivamente dos edifícios de valor patrimonial.

    Este conflito aplica-se também ao Projeto da Residência na Rua do Breiner promovido pelo Instituto Politécnico do Porto, em que a mesma estratégia de Licenciamento foi implementada.

    Ao abrigo do CPA agradeço que respondam ao meu pedido.
    Grato pela atenção, cumprimentos


    Pedro Ramalho,
    Movimento de cidadãos da cidade
    cidadaosmovimento@gmail.com

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  • Discussão Urbana

    Governar uma cidade é dar resposta aos cidadãos, organizando no espaço esta parte do território. Governar a cidade é 80% tratar de Urbanismo.
    É uma Ciência e é uma Arte que para agir necessita de compreender e, por isso, é complementada pela Sociologia, Geografia, História, Economia, e para saber dar respostas ainda necessita da Engenharia e da Arquitectura. (Naturalmente poderíamos acrescentar mais.)
    Infelizmente que, em Portugal, o que se entende por Urbanismo é algo que se relaciona com os processos administrativos para levar a cabo a construção e o seu Direito. Conclusão, temos o território e as cidades que temos.

    A “Discussão Pública” é um processo que deveria servir como um canal essencial para o envolvimento dos cidadãos nas decisões que afectam o ambiente urbano. No entanto, a participação pública em Portugal é completamente ineficaz, seja pela falta de compreensão dos processos, pela ausência de educação cívica sobre como participar, ou pela natureza desmotivante e complexa desses processos. A participação pública deveria ser um processo enriquecedor, onde as vozes da comunidade são realmente ouvidas e consideradas.

    O resultado dessa desconexão entre os cidadãos e os processos de planeamento acaba por não reflectir as necessidades e desejos de seus habitantes. O urbanismo deveria ser orientado pela visão dos cidadãos e por uma compreensão profunda do território. Isso requer uma mudança de paradigma, onde a educação sobre urbanismo e participação cívica seja alterada, e os processos de discussão pública sejam mais acessíveis e verdadeiramente democráticos.
    Um exemplo do que aqui refiro é que esta Discussão seria mais enriquecedora se nestes processos fossem feitas discussões alargadas à cidade, seguidos de concursos de concepção, igualmente com componente participativa.

    Essa a razão ela qual defendo uma discussão para a Av. da Ponte, seguida de um concurso e não da entrega do projecto, seja a quem for.
    Um mau exemplo disto é a UOPG 5 – Aleixo que se encontra em Discussão Pública. Mais uma oportunidade perdida de fazer Urbanismo.

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  • Se eu fosse autarca…

    … não prescindiria de manter um espaço de debate livre como este blog para ponderar decisões que tivesse de tomar. Um autarca não é um chefe tribal, é um representante dos cidadãos que se apresentou a eleições com um programa e que, nelas, conquistou o cargo. Se há opções políticas que estiveram expostas nesse programa, é seu dever concretizá-las. Mas se há propostas importantes que nunca foram expostas a voto (e se calhar poderiam ter sido), o seu mandato de representação não valida decisões tomadas sem debate público, ao menos informal.

    Mas não se trata apenas de validar opções políticas, trata-se mesmo de ajudar a construir soluções. Pelo menos para mim, estes últimos textos foram úteis para ajudar a formar opinião, serenamente com atenção aos argumentos de gente que respeito. Sociedade civil madura.

    Posto isto, sendo consensual que o Centro Histórico tem falta de residentes, como é que isso se resolve?

    Sou muito céptico quanto à capacidade da Administração Pública definir rumos para a evolução da cidade. Mais que isso, parece-me pouco saudável que o faça à revelia da iniciativa privada porque, lá está, são os privados (os cidadãos!) que devem orientar os poderes públicos, e não o contrário. Daí que o ideal seria aparecerem no mercado habitações adequadas à procura, em características e preço, porque a procura existe. Acontece que não aparecem, por várias razões. Se não conseguimos reunir capital privado suficiente para fazer surgir essa oferta, devemos então insistir com a Administração Pública para que use as ferramentas que tem à sua disposição, colmatando assim as lacunas do mercado.

    No caso da Avenida da Ponte, temos um activo muito relevante: o terreno é público, tem custo zero. Este é portanto um “luxo” de que dispomos: não há pressão para maximizar o volume de construção para amortizar o custo do terreno. O que nos dá total liberdade de especificar para lá exactamente a densidade que acharmos mais adequada.

    A propósito, tenho ultimamente passado uns dias em Arroios, em Lisboa, e fiquei agradavelmente surpreendido. Já não estava habituado, há anos e anos, a ter vizinhos residentes, muitos, uma cidade a funcionar saudavelmente. Lisboa (Estefânia, Saldanha, Almirante Reis) para residentes, incluindo imigrantes.

    Popular, com vida. Com problemas também, de gente à espera do SEF, etc. Mas fixe. Os imigrantes estão integrados e é gente trabalhadora (empregos humildes e precários). Há muita gente a circular nas ruas, de noite e de dia. Inspira segurança. Existe uma comunidade activa, até no interior dos quarteirões.

    Falta isto no centro do Porto: massa crítica. Mas 200 a 300 habitações novas na Avenida de Ponte receio que seja um exagero. Na minha opinião, devem ser habitações grandes que atraiam famílias que queiram lá ficar bastantes anos, o que implicaria um volume enorme. Concordo com a existência de algum espaço verde no lado Poente da avenida, que deixe respirar o interior do Morro da Sé, até em termos visuais. Alguma construção, mas edifícios pequenos, de autores variados. Do lado Nascente, em apostaria em edifícios mais altos, numa volumetria retalhada deixando ver a escarpa rochosa atrás, ligados também à sua cota superior.

    Se faltam apartamentos grandes e a preço acessível, nisso sou radical: quase toda a nova construção aqui deve ser para esse fim. E algum estacionamento enterrado para residentes, também. Sugeri anteriormente uma cooperativa. Insisto na proposta. Pode ser uma boa solução para pelo menos parte dos novos edifícios. Temos de nos organizar e conversar com a Câmara Municipal sobre tudo isto. É obrigação nossa e obrigação da autarquia.

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