Se eu fosse autarca…

… não prescindiria de manter um espaço de debate livre como este blog para ponderar decisões que tivesse de tomar. Um autarca não é um chefe tribal, é um representante dos cidadãos que se apresentou a eleições com um programa e que, nelas, conquistou o cargo. Se há opções políticas que estiveram expostas nesse programa, é seu dever concretizá-las. Mas se há propostas importantes que nunca foram expostas a voto (e se calhar poderiam ter sido), o seu mandato de representação não valida decisões tomadas sem debate público, ao menos informal.

Mas não se trata apenas de validar opções políticas, trata-se mesmo de ajudar a construir soluções. Pelo menos para mim, estes últimos textos foram úteis para ajudar a formar opinião, serenamente com atenção aos argumentos de gente que respeito. Sociedade civil madura.

Posto isto, sendo consensual que o Centro Histórico tem falta de residentes, como é que isso se resolve?

Sou muito céptico quanto à capacidade da Administração Pública definir rumos para a evolução da cidade. Mais que isso, parece-me pouco saudável que o faça à revelia da iniciativa privada porque, lá está, são os privados (os cidadãos!) que devem orientar os poderes públicos, e não o contrário. Daí que o ideal seria aparecerem no mercado habitações adequadas à procura, em características e preço, porque a procura existe. Acontece que não aparecem, por várias razões. Se não conseguimos reunir capital privado suficiente para fazer surgir essa oferta, devemos então insistir com a Administração Pública para que use as ferramentas que tem à sua disposição, colmatando assim as lacunas do mercado.

No caso da Avenida da Ponte, temos um activo muito relevante: o terreno é público, tem custo zero. Este é portanto um “luxo” de que dispomos: não há pressão para maximizar o volume de construção para amortizar o custo do terreno. O que nos dá total liberdade de especificar para lá exactamente a densidade que acharmos mais adequada.

A propósito, tenho ultimamente passado uns dias em Arroios, em Lisboa, e fiquei agradavelmente surpreendido. Já não estava habituado, há anos e anos, a ter vizinhos residentes, muitos, uma cidade a funcionar saudavelmente. Lisboa (Estefânia, Saldanha, Almirante Reis) para residentes, incluindo imigrantes.

Popular, com vida. Com problemas também, de gente à espera do SEF, etc. Mas fixe. Os imigrantes estão integrados e é gente trabalhadora (empregos humildes e precários). Há muita gente a circular nas ruas, de noite e de dia. Inspira segurança. Existe uma comunidade activa, até no interior dos quarteirões.

Falta isto no centro do Porto: massa crítica. Mas 200 a 300 habitações novas na Avenida de Ponte receio que seja um exagero. Na minha opinião, devem ser habitações grandes que atraiam famílias que queiram lá ficar bastantes anos, o que implicaria um volume enorme. Concordo com a existência de algum espaço verde no lado Poente da avenida, que deixe respirar o interior do Morro da Sé, até em termos visuais. Alguma construção, mas edifícios pequenos, de autores variados. Do lado Nascente, em apostaria em edifícios mais altos, numa volumetria retalhada deixando ver a escarpa rochosa atrás, ligados também à sua cota superior.

Se faltam apartamentos grandes e a preço acessível, nisso sou radical: quase toda a nova construção aqui deve ser para esse fim. E algum estacionamento enterrado para residentes, também. Sugeri anteriormente uma cooperativa. Insisto na proposta. Pode ser uma boa solução para pelo menos parte dos novos edifícios. Temos de nos organizar e conversar com a Câmara Municipal sobre tudo isto. É obrigação nossa e obrigação da autarquia.

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